As doutrinas dos cinco solas da Reforma: Sola Scriptura, SolusChristus, Sola Gratia, Sola Fide e Soli Deo GloriaNo dia 31 de Outubro de 1517, na porta da Igreja do Castelo de Wittenberg, na Alemanha,Lutero afixou as suas 95 teses que acabaram provocando o grande movimento religioso,conhecido como a Reforma do Século XVI. Nelas Lutero convidava os interessados adebater a questão das indulgências (que eram vendidas para a construção da Basílica deS. Pedro, em troca de perdão de pecados) e os males que esse tráfico religioso podiaacarretar. Era costume na época afixar em lugares públicos temas ou teses para debate econvidar os interessados para discuti-los. Embora ninguém tivesse comparecido para odebate, em pouco tempo toda a Alemanha conhecia as teses de Lutero, que lhe custarama bula de excomunhão, mas que representaram também o começo da obra de purificaçãoda Igreja e seu retorno à verdade.Em suas teses, Lutero questionava o poder (ou mesmo a intenção) do Papa de perdoarpecados ou de isentar alguém de penas, a não ser aquelas por ele mesmo impostas.Negava que esse perdão (de penas ou penitências) pudesse se estender aos que jáhaviam morrido e que, porventura, estivessem no purgatório. Para ele, só oarrependimento, seguido de atos de amor e penitência, com ou sem carta de perdão(indulgência) podia realmente perdoar pecados. Destacava o valor da Palavra de Deus, aqual não deveria ser silenciada em benefício da pregação das indulgências. A intenção doPapa, dizia, deve ser esta: se a concessão dos perdões - que é matéria de poucaimportância - é celebrada pelo toque de um sino, com uma procissão e com umacerimônia, então o Evangelho - que é a coisa mais importante - deve ser pregado com oacompanhamento de cem sinos, de cem procissões e de cem cerimônias (tese 55) e,ainda, o verdadeiro tesouro da Igreja é o sacrossanto Evangelho da glória e da graça deDeus (tese 62). Negava que a cruz adornada com as armas papais (que era carregadapelos vendedores de indulgências) tivesse o mesmo efeito que a cruz de Cristo (tese 79).Muitas outras questões foram levantadas nas teses, as quais acabavam batendo naprópria autoridade do Papa e na lisura de suas intenções. Lutero afirmava: Essa licenciosapregação dos perdões torna difícil, mesmo a pessoas estudadas, defender a honra doPapa contra calúnia, ou pelo menos contra as perguntas capciosas dos leigos. Essesperguntam: Por que o Papa não esvazia o purgatório por um santíssimo ato de amor e dasgrandes necessidades das almas; isto não seria a mais justa das causas, visto que eleresgata um número infinito de almas por causa do sórdido dinheiro dado para a edificaçãode uma basílica que é uma causa bem trivial? ... Que misericórdia de Deus e do Papa éessa de conceder a uma pessoa ímpia e hostil a certeza, por pagamento de dinheiro, deuma alma pia em amizade com Deus, enquanto não resgata por amor espontâneo umaalma que é pia e amada, estando ela em necessidade?... As riquezas do Papa hoje em diaexcedem muito à dos mais ricos Crassos; não pode ele então construir uma basílica de S.Pedro com seu próprio dinheiro, em vez de fazê-lo com o dinheiro dos fiéis? ... Abafaresses estudados argumentos dos fiéis apelando simplesmente para a autoridade papal emvez de esclarecê-los mediante uma resposta racional, é expor a Igreja e o Papa ao ridículodos inimigos e tornar os cristãos infelizes (teses 81, 82, 84, 86 e 90).Click aqui para leitura completa das 95 teses de LuteroCom essas e outras proposições Lutero alcançou mais do que podia imaginar. Atingiu oponto crucial do problema: a situação de distanciamento do Evangelho em que se2encontrava a Igreja. Os males da Igreja não eram apenas os seus desvios morais,econômicos e políticos, que a colocavam em descrédito perante o povo. Seu problemaprincipal, responsável também por estes, era o afastamento das doutrinas fundamentais daPalavra de Deus. A Reforma trouxe a Igreja de volta às Escrituras e ao Evangelho pregadopelos apóstolos. O próprio Lutero, de início, não estava totalmente livre dos erros pregadospor sua Igreja, como muito bem atesta sua crença no purgatório (teses 10, 11, 15, 16, 17,22, etc), e no valor da penitência (sofrimento) e do perdão do Papa para certos pecados(teses 6, 7, 8,12, 34, 38, 40, etc.). Foi o estudo da Bíblia que revelou quão longe a Igrejaestava afastada da verdade e a trouxe de volta à pureza de sua crença primitiva. AReforma restituiu à Igreja a crença em doutrinas chaves, que se tornaram essenciais paraa sua pregação e para distingui-la dos erros que continuaram e ainda são mantidos pelaIgreja Romana até os nossos dias. É a importância dessas doutrinas, conhecidas por suadesignação latina Sola Scriptura, Solus Christus, Sola Gratia, Sola Fide e Soli Deo Gloria,que queremos apresentar, ainda que de forma breve, neste estudo.1. Sola Scriptura - "Somente a Escritura", ou a autoridade e suficiência dasEscrituras.Para os reformadores, somente a Escritura Sagrada tem a palavra final em matéria de fé eprática. É o que ficou consubstanciado nas Confissões de Fé de origem reformada. AConfissão de Fé de Westminster, que adotamos, afirma:Sob o nome de Escritura Sagrada,ou Palavra de Deus escrita, incluem-se agora todos os livros do Velho e do NovoTestamento, ... todos dados por inspiração de Deus para serem a regra de fé e deprática... A autoridade da Escritura Sagrada, razão pela qual deve ser crida e obedecida,não depende do testemunho de qualquer homem ou igreja, mas depende somente deDeus (a mesma verdade) que é o seu autor; tem, portanto, de ser recebida, porque é apalavra de Deus... O Velho Testamento em Hebraico... e o Novo Testamento em Grego...,sendo inspirados imediatamente por Deus e pelo seu singular cuidado e providênciaconservados puros em todos os séculos, são por isso autênticos e assim em todas ascontrovérsias religiosas a Igreja deve apelar para eles como para um supremo tribunal... OJuiz Supremo, pelo qual todas as controvérsias religiosas têm de ser determinadas e porquem serão examinados todos os decretos de concílios, todas as opiniões dos antigosescritores, todas as doutrinas de homens e opiniões particulares, o Juiz Supremo em cujasentença nos devemos firmar não pode ser outro senão o Espírito Santo falando naEscritura.(I, 2,4,8,10). (Leia a CFW)A Igreja Católica Romana também aceita as Escrituras como Palavra de Deus, mas nãosó as Escrituras. Ela acredita que as decisões da Igreja através dos seus concílios e doPapa, quando fala oficialmente (ex cathedra) em matéria de fé e de moral, são igualmentea palavra de Deus, infalível. É o que se chama de Tradição da Igreja. Sobre a autoridadeda Igreja e do Papa, assim diz um autor católico: "Cristo deu à Igreja a tarefa de proclamarsua Boa-Nova (Mt 28, 19-20). Prometeu-nos também seu Espírito, que nos guia "para averdade" (Jo 16,13). Este mandato e esta promessa garantem que nós, a Igreja, jamaisapostataremos do ensinamento de Cristo. Esta incapacidade da Igreja em seu conjunto deextraviar-se no erro com relação aos temas básicos da doutrina de Cristo chama-seinfalibilidade... A infalibilidade sacramental da Igreja é preservada pelo seu principalinstrumento de infalibilidade, o Papa. A infalibilidade que toda a Igreja possui, pertence aoPapa dum modo especial. O Espírito de verdade garante que quando o Papa declara queele está ensinando infalivelmente como representante de Cristo e cabeça visível da Igrejasobre assuntos fundamentais de fé ou de moral, ele não pode induzir a Igreja a erro. Esse3dom do Espírito se chama infalibilidade papal. Falando da infalibilidade da igreja, do Papae dos Bispos, o Concílio Vaticano II diz: "Esta infalibilidade, da qual quis o Divino Redentorestivesse sua Igreja dotada... é a infalibilidade de que goza o Romano Pontífice, o Chefedo Colégio dos Bispos, em virtude de seu cargo... A infalibilidade prometida à Igreja residetambém no Corpo Episcopal, quando, como o Sucessor de Pedro, exerce o supremomagistério" (Lúmen Gentium, nº 25)[1]Sobre a relação entre as Sagradas Escrituras e a Tradição, diz esse mesmo autor: OConcílio Vaticano II descreve a Sagrada Tradição e as Sagradas Escrituras como sendo"semelhante a um espelho em que a Igreja peregrinante na terra contempla a Deus"(Constituição Dogmática Dei Verbum, sobre a Revelação Divina, nº 7). A palavra reveladade Deus chega até você mediante palavras faladas e escritas por seres humanos. AEscritura Sagrada é a Palavra de Deus "enquanto é redigida sob a moção do EspíritoSanto" (Dei Verbum, nº 9). A Sagrada Tradição é a transmissão da Palavra de Deus pelossucessores dos apóstolos. Juntas, a Tradição e a Escritura constituem um só sagradodepósito da palavra de Deus, confiado à Igreja"(Dei Verbum, nº 10). E mais adianteacrescenta: A Sagrada Tradição é a transmissão da Palavra de Deus. Esta transmissão éfeita oficialmente pelos sucessores dos apóstolos, e não oficialmente por todos os quecultuam, ensinam e vivem a fé, tal como a Igreja a entende. (Ibidem).No dias de Lutero a Igreja Romana já pensava assim e assim pensa até hoje. Na prática,a Tradição está acima da Bíblia para o catolicismo. Já que cabe à Igreja transmitir einterpretar a Bíblia, com igual autoridade e infalibilidade, é a palavra da Igreja, em últimainstância, que tem valor. O escritor católico, acima referido, diz: O Vaticano II fez o que aIgreja docente sempre tem feito: expressou o conteúdo imutável da revelação, traduzindo-opara formas de pensamento do povo de acordo com a cultura de hoje. Mas esta "traduçãodo conteúdo imutável" não é como que vestir notícias velhas com linguagem nova. Comoafirmou o Vaticano II: "Esta Tradição, oriunda dos Apóstolos, progride na Igreja sob aassistência do Espírito Santo. Cresce, com efeito, a compreensão tanto das coisas comodas palavras transmitidas... no decorrer dos séculos, a Igreja tende continuamente para aplenitude da verdade divina, até que se cumpram nela as palavras de Deus". (Dei Verbum,nº 8).Pelo Vaticano II a Igreja deu ouvidos ao Espírito, empenhou-se na sua "tarefa deperscrutar os sinais dos tempos e interpretá-los à luz do Evangelho" (Constituição PastoralGaudium et Spes sobre a Igreja no Mundo Moderno, nº 4). Nem sempre é claro aonde oEspírito está nos conduzindo. Mas o terreno no qual nós, a Igreja, caminhamos adiante danossa peregrinação é firme: o Evangelho de Cristo. Nesta etapa da nossa história, um denossos instrumentos básicos de Tradição - de transmissão da fé - são os documentos doVaticano II (Ibidem).Por este texto percebe-se que a Igreja Romana arroga a si não só a autoridade deinterpretar e contextualizar a Bíblia, de modo infalível, mas a de continuar a sua revelação.Por isso a leitura da Bíblia pelos leigos não é vista como necessária; e, em alguns casos, étida até como perigosa. A Reforma ensinou o livre exame das Escrituras. Qualquer pessoatem o direito e até o dever de examinar, por si mesma, se o ensino da Igreja está deacordo com as Escrituras. Foi o que fizeram os crentes de Beréia, pelo que foramelogiados (At 17:11). A Igreja pode errar e tem errado. A infalibilidade deve ser atribuídaapenas ao texto bíblico, não aos que o interpretam. Em nenhum lugar da Bíblia lemos quea promessa, dada aos apóstolos, de que o Espírito os conduziria a toda a verdade se4estenderia aos demais líderes da Igreja, em todos os tempos. Jesus prometeu-lhes que oEspírito não só os guiaria a toda verdade (Jo 16:13), mas lhes ensinaria todas as coisas eos faria lembrar de tudo o que lhes tinha dito (Jo 14:26). Isto só poderia aplicar-se a eles,os apóstolos. Só eles ouviram o que Jesus disse para poder lembrar-se depois, não osbispos nem os papas. A infalibilidade do Papa (e, por extensão, da Igreja) só foi declaradacomo dogma em 1870, no Concílio Vaticano I. Tal dogma, naturalmente, serviu aopropósito de dar "legitimidade" aos inúmeros ensinos contrários às Escrituras, tanto os jáanteriormente estabelecidos como outros que viriam depois, como a oração pelos mortos(310), a instituição da missa substituindo o culto (394), o culto a Maria (431), a invenção dopurgatório (503), a veneração de imagens (783), a canonização dos santos (933), ocelibato clerical (1074), o perdão através da venda de indulgências (1190), a hóstiasubstituindo a Ceia (1200), a adoração da hóstia (1208), a transubstanciação (1215), aconfissão auricular (1216), os livros apócrifos como parte do cânon (1546), o dogma daImaculada Conceição de Maria (1854) e o dogma da Assunção de Maria (1950), dentreoutros.Lutero se opôs naturalmente a esse ensino da Igreja. Já nas suas teses proclamava quecomete-se uma injustiça para com a palavra de Deus se no mesmo sermão se concedetempo igual, ou mais longo, às indulgências do que à palavra de Deus (tese 54) e que overdadeiro tesouro da Igreja é o sacrossanto Evangelho da glória e da graça de Deus (tese62). Comparava o Evangelho como "redes com que, desde a antiguidade, se pescamhomens de bem" enquanto que as indulgências eram "redes com que agora se pescam osbens dos homens" (teses 65 e 66). Mas foi na Dieta de Worms, em 1521, que demonstrouestar totalmente convencido de que as Escrituras eram a sua única autoridadereconhecida. Quando perguntado se estava disposto a se retratar das afirmações quefizera, negando autoridade a certas decisões de alguns concílios, sua resposta foi: Éimpossível retratação, a não ser que me provem que estou laborando em erro, pelotestemunho das Escrituras ou por uma razão evidente; não posso confiar nas decisões dosconcílios e dos Papas, pois é evidente que eles não somente têm errado, mas se têmcontradito uns aos outros. Minha consciência está alicerçada na Palavra de Deus, e não éseguro nem honesto agir-se contra a consciência de alguém. Assim Deus me ajude.Amém.Tanto a autoridade única como também a suficiência das Escrituras têm sido doutrinaspreciosas para as igrejas reformadas. Só a Escritura e toda a Escritura! Não precisamos deoutra fonte para saber o que devemos crer e como devemos agir. Hoje há uma tendênciapara se colocar a experiência humana e supostas revelações do Espírito no mesmo nívelde autoridade das Escrituras, por parte de alguns grupos evangélicos. Na prática, às vezesessas experiências acabam se tornando mais desejadas e tidas como mais valiosas doque o próprio ensino das Escrituras. Tomam hoje o lugar que, no passado, tomava aTradição. É preciso que voltemos ao princípio da Sola Scriptura, se queremos serrealmente reformados em nossas convicções e práticas. A Escritura, e não a nossaexperiência subjetiva, deve ser o nosso critério de verdade. Nossa pregação não devevisar o que agrada aos homens, mas o que agrada a Deus. Já dizia Lutero que os tesourosdas indulgências eram muito mais populares dos que os tesouros do Evangelho (teses 63e 64), e isso, certamente, porque faziam as pessoas se sentirem bem, aliviadas dosentimento de culpa, pela promessa, ainda que falsa, de perdão de pecados. Só apregação da Lei associada ao Evangelho pode realmente trazer o homem aoarrependimento e ao perdão divino. As Escrituras são a espada do Espírito. É por elas, e5não independente delas, que o Espírito age. Nossas experiências espirituais só têm valorse forem produzidas pela persuasão da Palavra.2. Solus Christus - "Somente Cristo", ou a suficiência e exclusividade de Cristo.O Catolicismo Romano afastou-se do Evangelho e instituiu o culto a Maria, já em 431, oculto às imagens, em 787, e a canonização dos santos, em 933. Instituiu também a figurado sacerdote como vigário de Cristo, a quem devem ser confessados os pecados e a quemsupostamente foi conferido poder para perdoá-los, mediante a prescrição de penitências.Um dos pontos centrais das teses de Lutero tinha a ver exatamente com o poder do Papae dos sacerdotes de perdoar pecados, que ele questionava, pelo menos no que dizrespeito aos mortos. Dizia ele: O Papa não tem o desejo nem o poder de perdoarquaisquer penas, exceto aquelas que ele impôs por sua própria vontade ou segundo avontade dos cânones. O Papa não tem o poder de perdoar a culpa a não ser declarandoou confirmando que ela foi perdoada por Deus; ou, certamente, perdoando os casos quelhe são reservados. Se ele deixasse de observar essas limitações a culpa permaneceria.Os cânones da penitência são impostos unicamente sobre os vivos e nada deveria serimposto aos mortos segundo eles (teses 5, 6 e 8). Mas admitia o sacerdote como vigáriode Deus, perante quem Deus podia perdoar a culpa, mediante humilhação do penitente (tese 7). Só mais tarde Lutero se libertou totalmente de alguns desses ranços de suaformação católica. Nem poderia ser diferente. Quando ele escreveu as teses, era ainda ummonge católico romano.O que o catolicismo ensina a respeito de Cristo não é diferente daquilo que professamosem nossos credos. A encarnação, nascimento virginal, divindade, morte vicária eressurreição são cridos e ensinados. O problema é que a Igreja Romana não crê nasuficiência e exclusividade da obra de Cristo para a salvação. Maria é erigida à posição deintercessora e até co-redentora (não oficialmente, ainda) e os santos entram também comos méritos de sua intercessão para a obra salvífica. O autor católico, acima citado, assimse refere a Maria: No seu livro "Maria em Sua Vida Diária", o teólogo Bernardo Häringobserva: "O Concílio Vaticano II coroou a Constituição Dogmática sobre a Igreja com umbelo capítulo sobre Maria, como protótipo e modelo da Igreja. A Igreja não pode chegar aentender plenamente a união com Cristo e o serviço a seu Evangelho, sem um amor e umconhecimento profundos de Maria, Mãe de Nosso Senhor e nossa Mãe". Com uma visãopenetrante na natureza profundamente pessoal da salvação, o Vaticano II abordou oinfluxo de Maria em nossas vidas.Por ser mãe de Jesus, Maria é a Mãe de Deus. É o que afirma o Vaticano II: "NaAnunciação do Anjo, a Virgem Maria recebeu o Verbo de Deus no coração e no corpo, etrouxe ao mundo a Vida. Por isso, é reconhecida e honrada como verdadeira Mãe de Deuse do Redentor"(Lumen Gentium, nº 53).Como Mãe do Senhor, Maria é uma pessoa inteiramente singular. Como seu Filho, ela foiconcebida como ser humano (e viveu toda a sua vida) isenta de qualquer vestígio dopecado original, isto se chama sua Imaculada Conceição. Antes, durante e após onascimento de seu filho Jesus, Maria permaneceu fisicamente virgem. No final da sua vidaMaria foi assunta - isto é, elevada - ao céu, de corpo e alma; a isso chamamos suaAssunção.6Na qualidade de Mãe de Cristo, cuja vida vivemos, Maria é também a mãe de toda aIgreja. Ela é membro da Igreja, mas um membro totalmente singular. O Vaticano II exprimesua relação conosco como a de um membro supereminente e de todo singular da Igreja,como seu modelo... na fé e na caridade. "E a Igreja católica, instruída pelo Espírito Santo,honra-a com afeto de piedade filial como mãe amantíssima"(Lumen Gentium, nº 53).Como uma mãe que aguarda a volta dos seus filhos adultos para casa, Maria nunca cessade influenciar o curso de nossas vidas. Diz o Vaticano II: "Ela concebeu, gerou, nutriu aCristo, apresentou-o ao Pai no templo, compadeceu com seu Filho que morria na cruz...Por tal motivo ela se tornou para nós Mãe, na ordem da graça"(Lumen Gentium, nº 61)."por sua maternal caridade cuida dos irmãos de seu Filho, que ainda peregrinam na terrarodeados de perigos e dificuldades, até que sejam conduzidos à feliz pátria"(LumenGentium, nº 62).Essa Mãe, que viu seu próprio Filho feito homem morrer pelo resto de seus filhos, estáesperando e preparando seu lugar para você. Ela é, nas palavras do Vaticano II, seu "sinalda esperança segura e do conforto" (Lumen Gentium, nº 68) (Ibidem)Com relação aos santos, diz esse autor: A igreja venera também os outros santos que jáestão com o Senhor no céu. São pessoas que serviram a Deus e ao próximo dum modotão notável, que foram canonizados, isto é, a Igreja declarou oficialmente heróicos, e nosexorta a rezarmos a eles, pedindo sua intercessão por todos nós junto a Deus. E ainda, AComunhão dos santos é uma rua de mão dupla:.. o Vaticano II afirma que, assim comovocê na terra pode ajudar aqueles que sofrem o purgatório, assim os que estão no céupodem ajudá-lo na sua peregrinação, intercedendo por você junto de Deus (Ibidem).Embora a Igreja Católica não tenha ainda proclamado oficialmente o dogma de Mariacomo co-redentora, o que vem sendo buscado por muitos de seus cultuadores (até agostode 1997 o atual papa já havia recebido 4.340.429 assinaturas de 157 países solicitandoque ele exercesse o poder da sua infalibilidade para proclamar o dogma de que "a VirgemMaria é co-redentora, mediadora de todas as graças e advogada do povo de Deus", cf.https://www.msantunes.com.br/juizo/odesvirt.htm), na prática ela é assim considerada e como apoio e ensino explícito do clero. No boletim diocesano da cidade de Itabuna (BA), assimse expressa Dom Ceslau Stanula, bispo da diocese: "Maria Co-Redentora - Mês de maio,um dos mais lindos do ano, a humanidade dedicou a Nossa Senhora. Quase em todas asigrejas e capelas diariamente neste mês, o povo se reúne para cantar ladainhas e louvoresa nossa Senhora. Nossa Senhora é invocada, venerada e cultuada pelas razões muitoprofundas e bíblicas. Maria é a Mãe de Jesus que é Deus, Filho de Deus nosso Salvador, eportanto ela é a Co-Redentora da humanidade". E para consusbstanciar sua declaraçãocita documento do Concílio Vaticano II que diz: "Assim de modo inteiramente singular, pelaobediência, fé, esperança e caridade, ela cooperou na obra do Salvador para arestauração da vida sobrenatural das almas. Por tal motivo ela se tornou para nós mãe naordem da graça". (LG 61) (https://www.snow.icestorm.net/siteverde/boletim1.htm)Certamente este não é o ensino da Bíblia. Ela nos diz que "há um só Deus e um sóMediador entre Deus e os homens, Cristo Jesus, homem" (1Tm 2:5), que, "por isso,também pode salvar totalmente os que por ele se chegam a Deus, vivendo sempre parainterceder por eles" (Hb 7:25) e que "não há salvação em nenhum outro; porque abaixo docéu não existe nenhum outro nome, dado entre os homens, pelo qual importa que sejamossalvos" (At 4:12). Não precisamos de intercessão de Maria ou dos santos, nem têm eles7qualquer poder para tal. Quem disse "na casa de meu Pai há muitas moradas... voupreparar-vos lugar", foi Jesus e não Maria (Jo 14:2). A obra de Cristo é suficiente para anossa salvação. Maria e todos os demais crentes só puderam ser salvos pela graça emediação eficaz de Cristo. Assim cantou ela: "A minha alma engrandece ao Senhor, e omeu espírito se alegrou em Deus, meu Salvador, porque contemplou na humildade da suaserva. Pois, desde agora, todas as gerações me considerarão bem-aventurada, porque oPoderoso me fez grandes coisas. Santo é o seu nome" (Lc 1:46-49). Quando o povo deListra quis adorar a Paulo e Barnabé, sua resposta foi a seguinte: Senhores, por que fazeisisto? Nós também somos homens como vós, sujeitos aos mesmos sentimentos, e vosanunciamos o evangelho para que destas coisas vãs vos convertais ao Deus vivo, que fezo céu, a terra, o mar e tudo o que há neles (At 14:15). Os verdadeiros santos nuncareivindicaram qualquer poder, glória ou honra para si mesmos. Certamente é falsa estaaspiração atribuída a Maria: "Até que eu seja reconhecida no lugar em que a SantíssimaTrindade desejou que eu estivesse, eu não poderei exercer meu poder totalmente, notrabalho materno de co-redenção e de mediação universal das graças... (Nossa Senhora aPadre Gobbi, 14/06/80)" [2]Uma outra conseqüência do princípio do Solus Christus foi a doutrina que ficou conhecidacomo a do "Sacerdócio Universal dos Crentes". Não necessitamos de outro sacerdote oumediador entre nós e Deus que não seja o Senhor Jesus Cristo. Cada um pode chegar-sea Ele diretamente, sem intermediários humanos. Como diz o autor aos Hebreus: "Tendo,pois, a Jesus, o Filho de Deus, como grande sumo sacerdote que penetrou os céus,conservemos firmes a nossa confissão. Porque não temos sumo sacerdote que não possacompadecer-se das nossas fraquezas; antes, foi ele tentado em todas as coisas, à nossasemelhança, mas sem pecado. Acheguemo-nos, portanto, confiadamente, junto ao tronoda graça, a fim de recebermos misericórdia e acharmos graça para socorro em ocasiãooportuna" (Hb 4:14-16).A Reforma trouxe à Igreja o Evangelho simples dos apóstolos, centrado na suficiência eexclusividade da obra de Cristo para a salvação. A velha confissão de Paulo foi de novo aconfissão dos reformadores: "Porque decidi nada saber entre vós, senão a Jesus Cristo eeste crucificado" (1Co 2:2)3. Sola Gratia - "Somente a Graça", ou a única causa eficiente da salvaçãoIntimamente ligado ao princípio do Solus Christus está o da Sola Gratia. A Bíblia ensinaque o homem é totalmente incapaz de fazer qualquer coisa para a sua salvação. Estáespiritualmente morto em delitos e pecados. Um morto nada pode fazer sem que antesseja vivificado. Paulo ensina como se operou a nossa salvação: "Ele vos deu vida, estandovós mortos nos vossos delitos e pecados ... e estando nós mortos em nossos delitos, nosdeu vida juntamente com Cristo, - pela graça sois salvos" (Ef 2:1,5). Foi "pela graça", dizPaulo, que fomos vivificados, estando nós mortos. A doutrina da inabilidade total dohomem para salvar-se foi um dos marcos da Reforma. No seu livro De Servo Arbitrio ("AEscravidão da Vontade"), Lutero nega que o homem tenha livre arbítrio, ou seja, acapacidade de escolher entre o bem e o mal, depois da queda. Vendido ao pecado, ohomem não tem mais a habilidade para escolher o bem, pois sua vontade está presa ouescravizada pelo pecado. Só pode e só quer escolher o pecado. A salvação é, portanto,exclusivamente ato da livre e soberana graça de Deus. Não só Calvino, como geralmentese pensa, mas também Lutero e os demais reformadores deram grande ênfase na8necessidade da graça soberana de Deus para a salvação do homem. É por isso que aeleição divina é incondicional.Todavia, não era isso que a Igreja ensinava nos dias da Reforma. O catolicismo, seguindoo pensamento de Pelágio e, principalmente, de Tomás de Aquino, acreditava e aindaacredita que o homem não está totalmente corrompido em sua vontade e natureza. Eleprecisa da graça de Deus, mas não no sentido regenerador, como cremos. Segundo ateologia romana o homem pode conhecer a Deus através de sua razão, conhecimento queé chamado de Teologia Natural. O documento 1806 (Denzinger) do Concílio Vaticano I(1869-1870) diz: "(Contra os que negam a teologia natural) - Qualquer que disser que oDeus verdadeiro, nosso Criador e nosso Senhor, não pode ser conhecido com verdadeiraexatidão pelas coisas que foram feitas, pela luz natural da razão humana, seja anátema(cf. 1785) (Cf. Denzinger 1810, 1812, 1816) (cf F.H. Klooster, Introduction to SystematicTheology (Grand Rapids: Calvin Theological Seminary, 1985, pp. 182-183).No artigo católico que temos citado, encontramos como eles entendem o pecado original:Com exceção de Jesus Cristo e de sua Mãe Maria, todo ser humano nascido neste mundoestá contaminado pelo pecado original. Como São Paulo declara em Rom, 5, 12: "Por meiode um só homem o pecado entrou no mundo e pelo pecado a morte, e assim a mortepassou a todos os homens porque todos pecaram".Embora continue a mostrar que há o mal neste mundo, a Igreja não está sugerindo que anatureza humana esteja corrompida. Ao contrário, a humanidade é capaz de fazer muitobem. Não obstante sintamos uma "tendência para baixo", ainda mantemos o controleessencial sobre nossas decisões. Permanece a vontade livre. E - o que é mais importante -Cristo, nosso Redentor, venceu o pecado e a morte pela sua morte e Ressurreição. Essavitória cancelou não apenas nossos pecados pessoais, mas também o pecado original eseus propalados efeitos. A doutrina do pecado original, portanto, entende-se melhor comoum escuro pano de fundo contra o qual pode ser aplicada, fazendo contraste, a brilhanteredenção adquirida para nós por Cristo, nosso Senhor. [3]Assim, o catolicismo estabeleceu os sacramentos da Igreja (que para eles são sete e nãodois) como meios pelos quais o problema do pecado pode ser tratado e a graça recebida.A Igreja torna-se medianeira ou mediadora da graça de Deus. Daí o ensino de que "fora daIgreja não pode haver salvação", entendida "Igreja" aqui não como o número total doseleitos (sentido espiritual) mas como a organização (visível) que, supostamente, detém opoder de distribuir e administrar a graça de Deus. No século XVI o cardeal RobertoBelarmino assim descreveu a Igreja Romana: "A única e verdadeira Igreja é a comunidadede homens reunidos pela profissão da mesma fé cristã e pela comunhão dos mesmossacramentos, sob o governo dos legítimos pastores e especialmente do vigário de Cristona terra, o Romano Pontífice" (Ibidem). Mas vem de longa data esse ensino. Assim seexpressaram alguns dos papas do passado: Papa São Gregório I (590-604): "Agora aSanta Igreja Universal proclama que apenas dentro dela Deus pode ser realmenteadorado, e que fora dela ninguém pode ser salvo." Papa Inocêncio III (1198-1216):"Realmente, existe apenas uma Igreja Universal dos fiéis, fora da qual ninguém é salvo.(...) Cremos com nossos corações e confessamos com nossos lábios que existe apenasuma Igreja, não a dos hereges, mas a Santa Igreja Católica e Apostólica Romana, fora daqual acreditamos que ninguém pode ser salvo." Papa Bonifácio VIII (1294-1303): "Nósdeclaramos, dizemos, definimos e proclamamos que é absolutamente necessário para asalvação de toda a criatura humana estar sujeita ao Pontífice Romano." Papa Eugênio IV9(1431-1439): "A Santa Igreja Romana acredita, professa e prega que todo aquele quepermanece fora da Igreja Católica, não apenas os pagãos, mas também judeus, heréticose cismáticos, não tomarão parte da vida eterna, mas irão para o fogo perpétuo, que foipreparado para o diabo e seus anjos, a não ser que antes da morte eles se unam à Igreja.É de tal modo importante a união com o corpo da Igreja, que seus sacramentos são úteispara a salvação apenas para aqueles que permanecem dentro dela, e jejuns, esmolas eoutros trabalhos piedosos, assim como a prática da guerra cristã, só proporcionarãorecompensas eternas a eles tão-somente." Papa Leão X (1512-1517): "Onde anecessidade de salvação se referir a todos os fiéis de Cristo, deverá estar sujeita aoPontífice Romano, como nos foi ensinado pelas Sagradas Escrituras, pelo testemunho dossantos padres e pela constituição do nosso predecessor de feliz memória, BonifácioVIII." [4]E não pensemos que a Igreja Romana mudou. Recentemente o cardeal Joseph Ratzinger,da Congregação para a Doutrina da Fé, o novo nome da velha "Congregatio PropagandaFide", mais conhecida como Inquisição, "causou escândalo" por afirmar na declaraçãoDominus Iesus, aprovada pelo papa, que "a Igreja Católica é o verdadeiro caminho para asalvação" (Folha de S. Paulo, de 27/09/2000, p. E8). Os mais ingênuos, que acreditam nasinceridade do diálogo do Vaticano com as outras religiões (ecumenismo), consideraramisso um retrocesso. Nada mais óbvio para a Igreja Católica, que jamais abdicará destaposição, sob pena de admitir seus erros e reconhecer-se falível.É por essa razão que a Igreja se julgava no direito de distribuir o perdão de pecadosatravés da venda das indulgências, pela prescrição de penitências e outros atos decontrição. Foi a Reforma que trouxe à luz a verdade da Sola Gratia, ensinada nasEscrituras. Onde a total inabilidade do homem for negada e os pretensos méritos humanosforem cridos, não haverá verdade bíblica. O homem nem mesmo pode cooperar com agraça regeneradora do Espírito. A salvação não é, em nenhum sentido, obra humana. Nãosão os métodos ou técnicas humanas que operam a salvação, mas tão somente a graçaregeneradora do Espírito. A fé não pode ser produzida por uma natureza decaída e morta."Pois nós também, outrora, éramos néscios, desobedientes, desgarrados, escravos detoda sorte de paixões e prazeres, vivendo em malícia e inveja, odiosos e odiando-nos unsaos outros. Quando, porém, se manifestou a benignidade de Deus, nosso Salvador, e oseu amor para com todos, não por obras de justiça praticadas por nós, mas segundo suamisericórdia, ele nos salvou mediante o lavar regenerador e renovador do Espírito Santo,que ele derramou sobre nós ricamente, por meio de Jesus Cristo, nosso Salvador" (Tt 3:3-5)4. Sola Fide - "Somente a Fé", ou a exclusividade da Fé como meio de Justificação.Falando da eleição, Paulo argumenta: E, se é pela graça, já não é pelas obras; docontrário, a graça já não é graça (Rm 11:6). A graça exclui totalmente as obras. O homemnada pode e nada tem para oferecer a Deus por sua salvação. A única coisa que lhe cabefazer é aceitar o dom da salvação, pela fé, quando esta lhe é concedida. Fé na obrasuficiente de Cristo, que lhe é imputada (creditada em sua conta) gratuitamente. Essa obraconsiste na sua vida de perfeita obediência à lei de Deus, em lugar do homem, obediênciaque nem Adão nem qualquer de sua descendência pôde prestar, dada a sua condição demorte espiritual. Por isso Cristo é chamado de o segundo ou o último Adão (1Co 15:45).Ela consiste também, e principalmente, de sua morte sacrificial em lugar do pecador eleito,através da qual é pago o preço exigido pela justiça de Deus para a justificação. A justiça de10Deus exige punição do pecado. Ele é aquele que "não inocenta o culpado" (Ex 34:7). Exigejustiça perfeita. Para que Deus pudesse punir o pecador, mas ao mesmo tempo declará-lojusto (que é o significado bíblico de justificar), foi preciso que alguém, sem culpa e comméritos divinos, assumisse o seu lugar. Foi o que o próprio Deus fez através de Cristo.Assumiu a culpa do pecador eleito e morreu em seu lugar, satisfazendo assim a justiça deDeus, ofendida pela pecado. Nada menos do que isso foi suficiente para justificar opecador. É o que se chama na teologia de "expiação". Desta forma, Paulo pôde falar emDeus como "aquele que justifica o ímpio" (Rm 4:5) e da morte de Cristo como amanifestação da sua justiça, para que ele pudesse ser justo e o justificador daquele quetem fé em Jesus. Diz ele: "sendo justificados gratuitamente, por sua graça, mediante aredenção que há em Cristo Jesus, a quem Deus propôs, no seu sangue, como propiciação,mediante a fé, para manifestar a sua justiça, por ter Deus, na sua tolerância, deixadoimpunes os pecados anteriormente cometidos; tendo em vista a manifestação da suajustiça no tempo presente, para ele mesmo ser justo e o justificador daquele que tem fé emJesus" (Rm 3: 24-26). É por isso também que os reformadores chamavam o crente desimul justus et peccator - ao mesmo tempo justo e pecador.Esta foi a doutrina central da Reforma. Lutero, de início, não podia compreender como a"justiça de Deus se revela no evangelho" ("visto que a justiça de Deus se revela noevangelho, de fé em fé, como está escrito: O justo viverá por fé". Rm 1:17). Para ele, ajustiça de Deus só poderia condenar o homem, não salvá-lo. Tal justiça não seria "boasnovas" (evangelho). Só quando compreendeu que a justiça de que Paulo fala nesse textonão é o atributo pelo qual Deus retribui a cada um conforme os seus méritos (o queimplicaria em condenação para o homem), mas o modo como Ele justifica o homem emCristo, é que a luz raiou em seu coração e a verdade aflorou em sua mente. Tornou-se,então, um homem livre, confiante e certo do perdão dos seus pecados. Compreendeu oevangelho! O Evangelho é a manifestação dessa justiça de Deus, que é recebida somentepela fé. Não é produzida pelas obras, pois o homem não as tem. ("Visto que ninguém serájustificado diante dele por obras da lei, em razão de que pela lei vem o pleno conhecimentodo pecado"... "concluímos, pois, que o homem é justificado pela fé, independentementedas obras da lei" Rm 3:20,28).É pela fé que o justo viverá. Quando Paulo cita esta passagem de Habacuque, ele a usapara ensinar que é através da fé, e não das obras, que alguém é declarado justo emCristo. Isto está mais claro na outra citação em Gl 3:11, quando ele diz: "E é evidente que,pela lei, ninguém é justificado diante de Deus, porque o justo viverá pela fé". Cristo é ajustiça de Deus ("mas vós sois dele, em Cristo Jesus, o qual se nos tornou, da parte deDeus, sabedoria, e justiça, e santificação, e redenção" - 1Co 1:30) e pela fé nele nóstambém somos feitos "justiça de Deus" ("Aquele que não conheceu pecado, ele o fezpecado por nós; para que, nele, fôssemos feitos justiça de Deus" (2Co 5:21). A fé, todavia,é apenas o meio, dado pelo próprio Deus, pelo qual essa justiça é imputada ao pecador,não a sua causa ou motivo. Do contrário, a própria fé seria "obra humana". Per fidempropter Christum - "pela fé, por causa de Cristo", como deixou claro a Reforma. A fé não éa base nem a causa meritória da justificação, mas o meio pelo qual ela é comunicada.Quão longe estava a Igreja dessa verdade simples do Evangelho quando ensinava que operdão podia ser comprado com dinheiro e a salvação adquirida com o mérito dos santos.Tetzel, o vendedor das indulgências do Papa Leão X na Alemanha, dizia que "ao som decada moeda que cai neste cofre, uma alma se desprende do purgatório e voa até oparaíso", refrão que seus ridicularizadores rimaram no que em português equivaleria a "no11que a moeda na caixa cai, uma alma do purgatório sai"("sobald das Geld im Kasten Klingt,di Seele aus dem fegfeuer springt") [5]Mas não pensemos que a Igreja Católica mudou. Ainda agora, neste ano considerado o doJubileu 2000, o Vaticano criou novas indulgências para reduzir ou anular as penas dospecados. Um "Manual de Indulgência", de 115 páginas, apresenta algumas das obras quepodem aliviar a punição dos pecadores no purgatório, dentre as quais estão um dia semfumar, rezar com o Papa em frente à televisão, ajudar refugiados, orar mentalmente comsurdos-mudos, não comer carne, etc, (cf. artigo "Igreja Católica cria novas indulgências",Folha de S. Paulo de 19/09/2000), além das que são permanentemente concedidas comovisitar o Vaticano e peregrinar por lugares sagrados. Isto na mesma época em que a Igrejaassinou, juntamente com luteranos da Federação Luterana Mundial, um acordo em que osdois grupos professam que : " a salvação decorre da graça de Deus e não das boas obras;só se chega à salvação pela fé; e, embora não levem à salvação, as boas obras sãoconseqüência natural da fé" (cf. artigo "Católicos e luteranos se reconciliam", da mesmaedição da Folha de S. Paulo, já citada). O acordo não é levado a sério pelos queconhecem o catolicismo e o modo como age, e recebeu críticas inclusive da parte deigrejas luteranas fiéis à sua origem. É visto apenas como uma manobra para promover oecumenismo e, principalmente, para combater o mercantilismo das igrejas neopentecostais,que vêm tirando adeptos das igrejas tradicionais, principalmente docatolicismo, com sua pregação da "teologia da prosperidade" (cf. artigo "Acordo visacombater 'mercantilismo'", da referida edição da Folha).A ênfase na doutrina da justificação somente pela fé é tão oportuna e necessária agoraquanto nos dias de Lutero, e não só porque o catolicismo não mudou, mas porque oprotestantismo mudou. São poucos os evangélicos hoje que ainda dão ênfase ao aspectoobjetivo da justificação unicamente pela fé. Experiências subjetivas, avivamentosemocionais, respostas a apelos e outras práticas estão tomando o lugar da pregação dostemas chaves da Reforma. As doutrinas do pecado original, da expiação vicária, da eleiçãoincondicional e da justificação somente pela fé estão sendo negadas hoje por muitosevangélicos que buscam uma acomodação à cultura da modernidade.5. Soli Deo Gloria - "A Deus somente, a glória", ou a exclusividade do serviço e daadoração a Deus.Coroando estes temas que a Reforma nos legou está o da "glória somente a Deus". Darglória somente a Deus significa que ninguém, nem homens nem anjos, deve ocupar o lugarque pertence a Ele, no mundo e em nossa vida, porque somente Ele é o Senhor. É o queexige o 1º mandamento: "Eu sou o SENHOR, teu Deus, que te tirei da terra do Egito, dacasa da servidão. Não terás outros deuses diante de mim" (Ex 20:1-2). A história dohomem é uma história de quebra desse mandamento. Depois do pecado, o homem temconstituído deuses para si em lugar do Deus verdadeiro. Geralmente, esse deus é elepróprio. Quando decide o que deve ou não crer, o que pode ou não ser verdadeiro, estádizendo que ele é o seu próprio deus. Sua razão (distorcida pelo pecado) é o seu critériode verdade. Quando a Igreja se coloca na posição de julgar o que deve ou não aceitar daBíblia, e se arvora em sua intérprete infalível, está assumindo para si o lugar de Deus.Quando ela prega a devoção a Maria e aos santos (ainda que diga que venera mas nãoadora), está usurpando a Deus da prerrogativa de sua glória exclusiva ("Eu sou o12SENHOR, este é o meu nome; a minha glória, pois, não a darei a outrem, nem a minhahonra, às imagens de escultura"; Isa 42:8). A doutrina católica, com sua ênfase nos méritose obras humanos, rouba a Deus de sua glória exclusiva.A glória de Deus é o fim para o qual Ele criou todas as coisas. Não é só o fim principal dohomem (conforme o nosso Breve Catecismo), mas o fim de todas as coisas. É o fim dopróprio Deus, como crê John Piper, porque Ele é o bem supremo (cf. Desiring God,Leicester: Inter-varsity Press, 1990, p. 13). Todas as coisas, e isso inclui a salvação, visama glória de Deus, não o bem estar dos homens (Ef 1:6,12,14). Por isso Deus é glorificadotambém nos que se perdem. É o que chamamos de "teocentrismo".Michael Horton afirma que Lutero lutou para distinguir sua obra de 'reformas' anteriores.Semelhantes a muitos dos movimentos frenéticos de reforma, renovação e avivamento dosnossos dias, as outras reformas se preocupavam com moralidade, vida da igreja emudanças estruturais, mas Lutero disse: 'Nós visamos a doutrina'. Não que fossem semimportância essas outras áreas, mas seriam secundárias. Contudo, com sua 'RevoluçãoCopernicana', nasceu um movimento teocêntrico que teve enormes efeitos sobre a culturamais ampla. A orientação da vida e do pensamento centrados em Deus começou no culto,em que o enfoque era na ação de Deus em sua Palavra e sacramento, em vez de estar emdeslumbrar e entreter as pessoas com pompa e aparato. Quando os crentes estavamcentrados em volta de Deus e sua obra salvífica em Cristo, seus cultos ajustavam suavisão a outro grau: deixavam de servir como pessoas mundanas para verem-se comopecadores redimidos, cuja vida só poderia ter um propósito: glorificar a Deus e gozá-lopara sempre" (Reforma Hoje, São Paulo: Editora Cultura Cristã, 1999, p.124).E foi devido a esse conceito de que vivemos para Deus e de que para ele devemos fazero melhor que a Reforma contribuiu para uma grande revolução não só no campo religioso,mas no mundo das artes, da ciência e da cultura em geral. Soli DeoGloria passou a ser olema não só de reformadores, mas de músicos (como Bach), pintores (como Rembrandt) eescritores (como Milton), que apunham às suas obras esta expressiva dedicatória ( Ibidem)Esta visão teocêntrica a Reforma encontrou na Bíblia. Depois de tratar das doutrinas dasalvação, Paulo declara: "Porque dele, e por meio dele, e para ele são todas as coisas. Aele, pois, a glória eternamente. Amém!" (Rm 11:36) e, ao concluir sua epístola aosRomanos, louva ao Senhor com estas palavras: "ao Deus único e sábio seja dada glória,por meio de Jesus Cristo, pelos séculos dos séculos. Amém! (16:27). A glória de Deustambém foi o tema do cântico dos anjos ao redor do trono, dos seres viventes e dosanciãos, e de todas as criaturas que João ouviu em suas visões, os quais diziam: "Digno éo Cordeiro que foi morto de receber o poder, e riqueza, e sabedoria, e força, e honra, eglória, e louvor" (Ap 5:12) e '"Àquele que está sentado no trono e ao Cordeiro, seja olouvor, e a honra, e a glória, e o domínio pelos séculos dos séculos" (Ap 5:13) e ainda "Aonosso Deus, que se assenta no trono, e ao Cordeiro, pertence a salvação...O louvor, e aglória, e a sabedoria, e as ações de graças, e a honra, e o poder, e a força sejam ao nossoDeus, pelos séculos dos séculos. Amém!" Ap 7:10-12.Quero concluir citando a esse respeito as palavras de James M. Boice, ex-pastor da 10ªIgreja Presbiteriana da Filadélfia, recentemente falecido. Ele diz: Meu argumento é que omotivo pelo qual a igreja evangélica atual está tão fraca e o porquê de nãoexperimentarmos renovação, embora falemos sobre nossa necessidade de renovação, éque a glória de Deus foi, em grande, parte esquecida pela igreja. Não é muito provável13vermos avivamento de novo enquanto não recuperarmos as verdades que exaltam eglorificam a Deus na salvação. Como podemos esperar que Deus se mova entre nós,enquanto não pudermos dizer de novo, com verdade: "Só a Deus seja a glória"? O mundonão pode dizer isso. Ao contrário, está preocupado com sua própria glória. ComoNabucodonozor, ele diz: Veja essa grande Babilônia que construí pelo meu poder e paraminha glória" . Os arminianos não podem dizê-lo. Podem dizer "a Deus seja a glória", masnão podem dizer "só a Deus seja a glória", porque a teologia arminiana tira um pouco daglória de Deus na salvação e a dá para o indivíduo, que tem a palavra final em dizer se vaiou não ser salvo. Mesmo aquelas pessoas do campo reformado não podem dizê-lo, se oprincipal que estão tentando fazer nos seus ministérios é edificar seus próprios reinos etornar-se importantes no cenário religioso. Nunca vamos experimentar a renovação nadoutrina, no culto e na vida enquanto não pudermos dizer honestamente: "só a Deus seja aglória" (Reforma Hoje, pp. 192-193).A Reforma nos legou esses grandes temas, que são doutrinas preciosas da Bíblia. Cabe anós hoje, seus legatários, dizer se somos ou não dignos herdeiros dessa herança econtinuadores dessa obra. O que cremos e o que pregamos representa nossa resposta. [6]Nota:[1]
https://www.geocities.com/Augusta/3540/doutrina.htm[2] https://www.geocities.com/Athens/Delphi/3665/milesp2.html[3] https://www.geocities.com/Augusta/3540/doutrina.htm[4] https://www.msantunes.com.br/juizo/odesvirt.htm.[5] https://www.infohouse.com.br/usuarios/zhilton/Luteranismo.html[6]'é Reformada - Biblioteca Reformada https://www.geocities.com/arpav/biblioteca/Autor: Rev.João Alves dos SantosFonte: https://www.scribd.com/doc/44466/
As-Doutrinas-da-ReformaRev.João Alves dos Santos É Professor Assistente de Teologia Exegética (NT) do CPAJ.É graduado em teologia pelo Seminário Presbiteriano Conservador (B.Th., 1963); mestreem Divindade e em Teologia do AT pelo Faith Theological Seminary (M.Div., 1973, eTh.M., 1974) e mestre em Teologia do NT pelo Seminário Presbiteriano Rev. José Manoelda Conceição (Th.M., 1985). É também graduado em Direito pela Faculdade de Direito deBauru, SP (1969) e em Letras pela Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras Prof. José A.Vieira, em Machado, MG (1981). Foi professor de Grego e Exegese do NT no SeminárioPresbiteriano Rev. José Manoel da Conceição (1980-2004) e professor de Teologia14Sistemática no Seminário Presbiteriano Conservador (1974 -2004). Foi também professorde Grego e Exegese do NT no Seminário Presbiteriano do Sul (1980 a 1986) e o primeirocoordenador do CPAJ (1991). É ministro da Igreja Presbiteriana Conservadora do Brasil emembro do corpo editorial da revista Fides Reformata.
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